terça-feira, 12 de novembro de 2013

O Santo.

Totalmente desesperado com o que lhe havia acontecido, Vitório ficou instantaneamente prostrado perante aquele inesperado e terrível infortúnio.

Verdadeiro homem de bem, Vitório sempre foi uma pessoa cordata. Excelente marido e bom pai, ele era uma daquelas pessoas que vivem exclusivamente para a família. A sua boa índole levava-o a paparicar até mesmo os seus sogros.

Sempre tranqüilo e com um leve sorriso nos lábios, ironizava quando seus amigos mais chegados caçoavam sobre a sua forma de ser:

- Ser assim não faz mal a ninguém! Além do mais, a gente termina marcando sempre alguns pontinhos. Nunca e sabe quando você vai precisar deles.

Dizia ele num tom quase profético.

Assim era Vitório. Um homem sério, daqueles que pouco se vê por aí. Mas tinha um defeito, um único defeito. Defeito este que ele escondia de todos. Não podia ver um rabo de saia que enlouquecia.

Quando isso acontecia, entrava em um estado psicológico febril. Sua mente passava a trabalhar como a de um enxadrista e de forma frenética, tratando logo de elaborar um plano complexo, onde as mais variadas possibilidades eram analisadas. Criava uma verdadeira trama, tudo para que sua vítima não tivesse a mínima chance. Vitório vibrava durante a formulação dos seus planos, sendo que o planejamento, por si só, já se transformavam em grande fonte de prazer.

Quando concluía pensava satisfeito:

- Essa é galinha morta! Já esta no papo.

Através de movimentos sinuosos e dissimulados, na tentativa de ludibriar a sua vítima, ele partia para o ataque. Mas, sempre por algum motivo, por mais que ele tentasse elaborar um plano perfeito, alguma coisa saía errada. Consternado e frustrado, Vitório, via a sua presa escapar-lhe por entre as frestas de sua armadilha.

Mas havia um plano, este sim, infalível. Com ele os seus anseios mais secretos nunca haviam sido frustrados.

Como homem de negócios, sempre que ganhava algum bom dinheiro extra, guardava-o sem dizer nada à esposa. No momento oportuno fazia uma “viagem comercial” para a capital, onde dizia ter negócios.

Chegando lá á noite, ia direto para uma determinada “casa”, onde já era conhecido por todas as “meninas”. Elas o chamavam de Castelo, que era o seu ultimo nome. Quando chegava, famoso por suas gorjetas polpudas, a voz corria entre elas: - Castelo chegou, Castelo chegou!

E assim Castelo se entregava totalmente ao prazer e a esbórnia. Passava toda a noite e parte do dia.

Inteiramente saciado nos seus instintos mais básicos, logo retornava para casa e, naturalmente, com grana do seu negócio bem sucedido.

De voltava, sempre levava algo singelo para sua esposa Marlene, e nunca esquecia as lembrancinhas dos seus amados sogros.

Como era de hábito, Marlene já sabia que logo depois, Vitorio, como um pombinho apaixonado, iria sair com ela para lhe comprar um grande presente com o dinheiro que ele havia ganhado na tal “viagem comercial”.

Sim, esse era um plano infalível, Não havia o que dar errado e todos ficavam felizes e ansiosos pela sua próxima ida.

Mas, um dia, algo aconteceu. Ao retornar de uma delas e ao chegar em casa, Vitório deparou-se com toda a família reunida na sala, em frente da televisão. Lá estavam a esposa, os filhos, sogro e, naturalmente, a sogra. Todos com cara de que alguma coisa muito séria havia ocorrido.

Ao sentir o clima um tanto quanto pesado, Vitório, como sempre fazia pronunciou, porém desta vez meio desconfiado:

- Minha lindinha, olhe o que eu trouxe para você!

Ele trazia para sua mulher uma cestinha de caqui.

Nada poderia ser mais ingênuo e dissimulado que uma cestinha de caqui.

Ao vê-lo, Marlene, em um estado totalmente colérico, fuzilou sem piedade:

- Seu miserável! Já estamos sabendo de tudo! Passou tudo na televisão. Que vergonha! Que vergonha!

E...e ....e. e tire esta cestinha de caqui da minha frente seu, seu,.........seu miserável.

E lá estava a televisão repetindo a cena mais uma vez, em um daqueles programas policiais. Naquele dia, por azar de Vitório, a policia tinha dado uma batida na casa das meninas, e recolhido todos para averiguações. Vitório aparecia na TV saindo do local ainda se vestindo e carregando seus sapatos. Devido há situação que se encontrava, ele não havia percebido a presença da televisão.

Finalmente, o plano infalível tinha dado zebra.

Totalmente desesperado com o que lhe havia acontecido, Vitório ficou instantaneamente prostrado perante aquele inesperado e terrível infortúnio.

Atônito por ter sido descoberto, e ainda segurando a cestinha de caqui, balbuciou completamente atordoado:

- Marlene, não fale assim comigo, não fale assim comigo.

- Você sabe que sou um santo!

Você sabe que sou um santo!

E lá do fundo da sala ouviu-se uma voz dizendo:

- Eu é que nunca acreditei nos mimos deste canalha.

Era a sogra.

E por causa desse veredicto, Vitório nunca conseguiu resgatar os seus “pontinhos acumulados”.

Claudio Sarnelli

28/04/2013

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