quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Sentimentos.

Apressados, quatro homens entraram em uma sala de velório levando um caixão. Nele se encontrava o corpo de um senhor idoso, que acabara de falecer momentos antes. Uma equipe de funcionários já se encontrava lá arrumando o que faltava, para que se pudesse dar início, o mais rápido possível, ao ritual religioso. Ainda não eram dez horas da manhã.

Logo que se encerraram os preparativos, começaram a chegar as coroas de flores, uma após a outra, e a sala se tornou pequena para tantas flores. Os familiares iam chegando e se posicionando ao lado do morto, num ambiente que já exalava um forte cheiro; mistura de velas e flores.

As feições das pessoas não pareciam transtornadas com o acontecido. Talvez porque já se sabia, e há muito tempo, que o Sr Ruan tinha um câncer sério, e que nos últimos dias a situação havia se agravado.

O próprio Ruan falava dele com tranqüilidade e total consciência de sua gravidade. Tanto assim que já tinha deixado toda a sua documentação em ordem, com explicações escritas para tudo, tentando facilitar ao máximo a sua família, após a sua partida.

Dias antes, Ruan acabara de voltar de sua ultima viagem à praia, junto com sua irmã, idosa e viúva como ele. Esse era um costume que os dois irmãos criaram após Ruthe também enviuvar.

Porem, esta ultima viagem foi diferente das demais. Ruan passou a maior parte do tempo no quarto do hotel. As dores começaram a se intensificar e já não conseguia mais andar direito.

Quando não foi possível mais suportar o sofrimento, pediu para a irmã que antecipasse a volta. Mas, já era tarde. Do aeroporto foi direto para o hospital, sendo que após alguns dias veio a falecer.

Um padre foi chamado às pressas e meio a contra gosto, devido a aquela pressa toda, realizou a cerimônia de praxe. Em seguida, deu-se enterro propriamente dito, e mesmo antes de se completar totalmente o lacre do jazigo, alguns familiares já se retiravam. Ainda não eram doze horas da manhã.

Dentre os que saíram inicialmente, estava Ruthe.

Na saída do cemitério Ruthe fala para a sua filha mais nova:

- Felizmente conseguimos fazer tudo há tempo, agora podemos nos concentrar no aniversário de Nina (sua neta preferida).

A turma foi informada, ainda no cemitério, que mesmo tendo havido o enterro do tio avô Ruan, haveria a festa de aniversário da Nina.

Ruthe a filha e mais duas senhoras partiram para a casa, para aprontar a festa, que seria naquele mesmo dia, no final da tarde.

Como de costume, em dia de festa, um corre core se estabeleceu na casa, mas, exatamente às 17 horas estava tudo pronto para a recepção.

A chegada dos convidados foi um tanto quanto esquisita. Devido aquela situação inusitada, eles não sabiam exatamente o que dizer, e assim evitaram dar os parabéns para os donos da casa.

A situação se tornou realmente bizarra, quando foram cantar os parabéns para a Nina. Aí o constrangimento foi geral, até que um deles, mais arrojado, puxou a musica com veemência, e assim todos cantaram.

A partir daquele momento a festa transcorreu como todas as outras. Com muitas brincadeira e crianças correndo de lá para cá. Em fim, o mal-estar de se fazer aquela festa no mesmo dia da morte do tio Ruan, tinha acabado. E assim a reunião foi até o fim.

Quando todos os convidados foram embora, Ruthe vira para a filha e diz aliviada:

- Ainda bem que a morte do Ruan não estragou a festa da Nina.

Imagina como ela ia ficar se não houvesse a festinha.

Alguns minutos depois ela procura a filha, e desta vez, com ar de consternação, diz:

- Sabe filha, vou lhe confessar uma coisa.

Ruan já está me fazendo uma falta danada!

Não sei se vou agüentar a viver sem ele!

Você me conhece, sou uma pessoa muito sentimental.

Claudio Sarnelli

09/04/2013

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